sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

Consolações do Purgatório

Então há no purgatório alegrias e consolações? É possível que em meio de tanta dor, de tão horríveis suplícios como os da pena do dano e do fogo, haja ainda um raio de luz, uma alegria, uma consolação para as pobres almas?

Sim, porque o purgatório é a pátria da justiça rigorosa, mas o é também da infinita misericórdia de Deus. Já não é uma grande misericórdia Deus nos reservar um lugar de expiação além-túmulo? Purifi­car-nos misericordiosamente para nos tornarmos dig­nos de sua eterna Presença? Ó, sim, o purgatório é uma misericórdia de Nosso Senhor. E como todas as obras da divina misericórdia, há de ter a unção e a doçura da Eterna Bondade. Quanto nos apavora a Justiça divina naquelas chamas expiadoras e que terror para nossa alma saber o que nos espera depois desta vida! Todavia, console-nos a idéia de que há no purgatório consolações que excedem a todas que pos­samos ter nesta vida. É um tormento e uma felici­dade sem par. Um mistério que nos será desvenda­do mais tarde. Alguns autores insistem muito no sofrimento do purgatório e nada falam das alegrias e consolações. É mister guardar um justo equilíbrio.

Nem transformar o purgatório num verdadeiro in­ferno, nem fazer dele o paraíso. É um lugar de expia­ção e de tormentos horríveis, não há dúvida, mas há nele a doce esperança da salvação, esperança acom­panhada da certeza absoluta de um dia chegar à pos­se de Deus na Bem-aventurança. E isto não é uma felicidade sem par? Quando São Francisco de Assis soube que era um predestinado e viu garantida por revelação do céu a sua glória, teve uma alegria tão grande, que nenhuma linguagem humana o poderia traduzir. Que não será a alegria das pobres almas na certeza de serem predestinadas?

São Francisco de Sales, cuja doutrina é um bál­samo suavizante das almas, fala das alegrias e con­solações do purgatório. Escreve o melífluo Doutor: “A maioria dos que temem o purgatório é muito mais por interesse e amor de si mesmos do que pelo inte­resse de Deus. E daí vem que falam ordinariamente só das penas daquele lugar e nunca falam da felici­dade e da paz que desfrutam as almas que lá estão. É verdade que os tormentos são extremos, e as maio­res e mais terríveis dores desta vida não se podem comparar a eles, mas também as satisfações interio­res são tais e tantas, que nenhuma prosperidade nem alegria da terra existe que a elas se possam igualar. Si é uma espécie de inferno quanto à dor, é um pa­raíso quanto à doçura que a caridade difunde no co­ração. Caridade mais forte do que a morte e mais poderosa do que o inferno. Feliz estado mais dese­jável que temível, pois suas chamas são chamas de amor e de caridade. Terríveis penas, sim, pois elas retardam a hora da visão de Deus, e de amar a Deus e louvá-lo e glorificá-lo por toda eternidade”[1].

Eis aí o tormento e a alegria das almas do pur­gatório.

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